Filme ‘Tetris’ mostra como jogo fugiu da União Soviética para fazer sucesso mundial

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Como pecinhas caindo e se encaixando lentamente, a trama de “Tetris” pode levar um tempo até fazer sentido para o espectador. A história por trás da sensação dos games, afinal, é totalmente absurda e inesperada, o que deixa o roteiro do filme não exatamente confuso, mas difícil de assimilar.

Noah Pink, o roteirista, fez o melhor que pode com o material que tinha. Apesar da premissa simples de contar a história de um dos games mais vendidos do mundo, o roteiro lida ainda com a crise do comunismo, os embates entre a Rússia e o Ocidente e minúcias do mundo corporativo.

Exibido no início do mês no South by Southwest, o SXSW, o longa é protagonizado por Taron Egerton e tem direção de Jon S. Baird, britânico indicado ao Bafta por “Stan & Ollie”. Diferentemente do que acontece com os filmes lançados em Cannes, Berlim ou outros festivais mais tradicionais, desta vez o público não terá que esperar tanto, pois “Tetris” estreia já nesta semana no Apple TV+.

O filme se passa no momento em que, poeticamente, o game sobre bloquinhos caindo, criado pelo engenheiro da computação russo Alexey Pajitnov, tentava sair da União Soviética em meio à iminente queda do bloco.

Não foi fácil tirar aquela ideia simples, prestes a conquistar todo o mundo, da cortina de ferro, como o roteiro atesta. A iniciativa partiu de Henk Rogers, um holandês que era ele próprio desenvolvedor de games e que, ao descobrir o potencial de “Tetris”, decidiu apostar todas as suas fichas no jogo.

Contrariando qualquer recomendação, ele deixou o Japão, onde morava e trabalhava, rumo a Moscou, para se encontrar com os detentores dos direitos do jogo e, assim, garantir sua distribuição para outros países.

Mas outros empresários do Ocidente já estavam de olho naquela mina de ouro, o que dá início a uma complexa briga entre eles, que cruza com os interesses não ortodoxos das autoridades soviéticas que controlavam não apenas a papelada, mas a própria vida de Pajitnov.

A princípio, uma trama sobre uma batalha por direitos de distribuição não parece ser, exatamente, material digno de Hollywood. Mas as disputas que envolveram o licenciamento do game foram tão complicadas e até mesmo perigosas que “Tetris” acabou por se tornar praticamente um thriller de espionagem da Guerra Fria, na linha de “Ponte dos Espiões”, mas com o didatismo de “A Grande Aposta”.

Os longas serviram de inspiração para Baird, que ao receber o roteiro ficou encantado com a possibilidade de mergulhar no sigiloso e não tão distante mundo da Rússia comunista. Formado em relações exteriores, o cineasta identificou ali uma história com potencial de atrair não só os nerds de história mundial ou de videogames, mas qualquer fã de cinema.

“O nome original do filme nem era ‘Tetris’. Tinha algo a ver com blocos caindo. Quando recebi o roteiro, achei que era sobre geopolítica. Mas depois você percebe que aquela batalha por algo que você nem pode ver, direitos autorais, é tão louca que me fez lembrar que as histórias mais bizarras são as que dão os melhores filmes”, diz.

Em meio a inserções gráficas em oito bits –tecnologia por trás das animações blocadas, como o primeiro “Super Mario Bros.”–, “Tetris” se alterna entre momentos de ação e comédia, enquanto clássicos oitentistas são entoados em russo, mergulhando o espectador ainda mais naquela União Soviética doida para se jogar nas influências estrangeiras e, ao mesmo tempo, protecionista em relação à própria cultura.

Rogers e Pajitnov, hoje amigos e sócios da The Tetris Company, ainda se lembram dos embaraços e perigos que cercaram, primeiro, a fuga do holandês com o jogo debaixo do braço e, mais tarde, a mudança de Pajitnov para os Estados Unidos. Não que tudo tenha acontecido exatamente como nas telas, mas isso é parte da fanfarra de Hollywood, contam.

Produtores do filme, eles se dizem surpresos com o alcance que “Tetris” ainda tem, mas atribuem sua sobrevivência justamente à simplicidade. Com isso, ele se tornou um game que não tem público-alvo, jogado por qualquer gênero, idade ou país, mesmo diante de um setor completamente diferente daquele dos anos 1980. Hoje, ele é como uma indústria de filmes interativos, avalia Rogers.

Outra coisa que mudou radicalmente foi a percepção de Pajitnov em relação a seu país. Mesmo que “Tetris” mostre a União Soviética em colapso, o desenvolvedor rememora aquela época como cheia de expectativa de que boas mudanças viriam para os russos.

“Era um período sombrio para o bloco, mas de muitas possibilidades para a Rússia. Hoje, infelizmente, estamos num momento de desilusão, com essa guerra horrível e criminosa contra a Ucrânia. Não há mais esperança”, diz ele, que costumava visitar o país com frequência até a eclosão do conflito.

Quem o interpreta em cena é Nikita Efremov, enquanto o papel de Henk Rogers ficou com o galã Taron Egerton, com um bigode marcante que remete ao Mario da Nintendo. O ator precisou esconder por baixo de camisas estampadas e bufantes os músculos marmorizados e bem cultivados que, com frequência, exibe em seus trabalhos.

Mas “Tetris” segue justamente uma espécie de redirecionamento de carreira, desde que o britânico foi alçado à fama pela figura do bonitão agente secreto que interpretou na franquia “Kigsman”. “O que você quer dizer com isso? Que eu não sou mais bonitão?”, diz ele com bom humor ao ser questionado sobre a mudança no perfil dos papéis que tem feito.

No Apple TV+, ele está no segundo. Se em “Tetris” vive um homem dos negócios que é nerd por essência, na série “Black Bird” foi um traficante de drogas que, na prisão, vê a oportunidade de diminuir sua pena caso convença um serial killer a confessar seus crimes.

Antes disso, emprestou a voz para o narrador da série de fantasia “Sandman” e para a animação “Sing”, enquanto em “Rocketman” a voz também foi instrumento primordial para narrar a história de Elton John com muita música e dança. Em “Voando Alto”, novamente, viveu um personagem real, o saltador de esqui Eddie Edwards, misturando comédia e drama.

São papéis que destoam daquilo que o fez famoso. Para além de “Kingsman”, houve “Robin Hood: A Origem”, outro filme de ação lançado com alarde, mas que recebeu um game over nas bilheterias, e “O Clube dos Meninos Bilionários”, em que mais uma vez fazia o tipo de cabelo bem cortado capaz de conquistar qualquer um na rua.

“Tento nunca fazer mais do mesmo. Esses trabalhos todos refletem quem eu sou, mas por prismas diferentes. Amei fazer ‘Kingsman’, fazer esse cara bonitão, meio James Bond, mas quero papéis que não sejam só galãs. É bom buscar coisas diferentes”, diz.

Autor(es): LEONARDO SANCHEZ / FOLHAPRESS

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