Brasil vira alvo de sanções da Guiné Equatorial após PF mirar filho de ditador

SÃO PAULO, SP E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Em retaliação ao Brasil, a ditadura da Guiné Equatorial decretou o congelamento dos bens e das contas bancárias de três empreiteiras brasileiras que atuam no país. A medida destoa de outras fases do relacionamento entre os países que, em especial nos governos Lula 1 e 2, foram próximos.

A reação da Justiça de Malabo, subjugada a Teodoro Obiang Nguema Mbasogo -o ditador mais duradouro do mundo-, contra as empresas ARG, Zagope e OAS vem em resposta à operação da Polícia Federal que mira um dos filhos de Obiang, conhecido como Teodorín.

À Folha de S.Paulo o Itamaraty disse que o governo acompanha com preocupação as decisões da Justiça guineense e que elas ignoram que os bens confiscados são alheios ao Estado -são, afinal, privados.

No Brasil, a operação apelidada de #LuxuryLiving (vida de luxo) mirava suposta lavagem de dinheiro na compra de um apartamento em área nobre da capital paulista, em 2007, por R$ 15,6 milhões à época -Guiné Equatorial alega que o imóvel era de uso diplomático. O apartamento na rua Haddock Lobo está sob ordem de bloqueio, assim como automóveis de luxo de Teodorín que ficavam no local. A investigação ainda está em andamento e depende do desenrolar de meandros da cooperação internacional.

A investigação também olhava para outros bens, possivelmente de origem ilícita, apreendidos com o filho do ditador em 2018 no Aeroporto de Viracopos, em Campinas, quando ele ocultou bens da alfândega.

Ao todo, na apreensão de 2018, foram encontrados com ele US$ 1,4 milhão em espécie e 20 relógios de luxo, avaliados em US$ 15,4 milhões. A operação foi batizada à época de Salvo Conduto.

Na decisão da Justiça do país africano compartilhada pelo próprio Teodorín nas redes sociais, um juiz de primeira instância alega que é preciso ressarcir danos e prejuízos causados pelo Brasil à Guiné Equatorial. O governo estima o prejuízo em torno de 80 bilhões de francos CFA (R$ 640 milhões).

Teodorín, considerado número 2 do regime, subiu o tom. “A única coisa que o governo e a Justiça do Brasil conseguiram foi se prejudicar”, escreveu ele. “Esperamos que a decisão seja uma lição para que, no futuro, saibam medir a consequência de seus atos.” Em outro post no Twitter, disse “ser uma pena ter chegado ao extremo com o Brasil, apesar das boas relações que vínhamos mantendo”. “Um tema que poderia ter sido resolvido facilmente provocou reações drásticas que sacudiram a economia de empresas do Brasil.”

Ele afirmou ainda que o que chama de represália permitiu que fossem recuperados “cinco vezes mais o valor dos objetos [apreendidos]”.

A Polícia Federal deflagrou em dezembro uma operação transnacional para investigar possível crime de lavagem de dinheiro cometido por Teodorín. Mandados de busca e apreensão foram cumpridos por meio de cooperação da PF na França, em Portugal e na Suíça.

A reportagem procurou as três empresas punidas pela Justiça em Malabo, por meio dos contatos disponibilizados em seus sites oficiais, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

Representantes de Brasil e Guiné Equatorial devem se encontrar na próxima cúpula da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), grupo que os dois países integram -ainda que na nação africana o idioma predominante seja o espanhol. O encontro ocorre em São Tomé e Príncipe, em agosto deste ano.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já confirmou participação. O petista é visto por alguns líderes do bloco como peça-chave para fazer deslanchar a aliança lusófona, ainda que entre o corpo técnico das missões diplomáticas haja ceticismo quanto a isso. Em 2010, no final de seu segundo mandato, ele foi à Guiné Equatorial, sob críticas. O Brasil foi um dos fiadores da entrada do país na CPLP. À época da visita, o então chanceler Celso Amorim, hoje assessor especial da Presidência, disse que negócios eram negócios.

“Estamos num continente em que os países ficaram independentes há pouco tempo”, disse ele à época. “O isolamento só faz que dependam mais de outros e talvez fiquem até mais longe do que desejamos.”

As firmas alvo de sanções são do ramo de construção, área em que a presença do setor privado brasileiro cresceu na Guiné Equatorial no início deste século, mas refluiu com o passar dos anos e os escândalos de corrupção local. Todas também têm negócios em outros países da África. A ARG esteve no centro de uma ação penal contra Lula que tramitou em São Paulo e foi encerrada em agosto de 2021. No processo, o petista era acusado de lavagem de dinheiro por meio de doações feitas ao Instituto Lula pela empreiteira.

Teodorín, protagonista do imbróglio, já sofreu sanções e condenações no Reino Unido, nos EUA e na França sob a acusação de que pagou carros, imóveis e roupas com dinheiro oriundo de corrupção em seu país, no qual o petróleo domina a economia. O filho de Obiang parece ter utilizado tática semelhante à que agora usa com o Brasil para pressionar outros países. Ele ameaçou, por exemplo, fechar a embaixada da França pouco antes de ser condenado por lavagem de dinheiro em 2021 e ter bens confiscados.

Autor(es): MAYARA PAIXÃO E FABIO SERAPIÃO / FOLHAPRESS

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