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Um vídeo publicado na rede social TikTok mostra um helicóptero sobrevoando uma aldeia que, segundo a Urihi Associação Yanomami, pertence aos indígenas isolados conhecidos como Moxihatëtëma thëpë, que vivem na Serra da Estrutura dentro da Terra Indígena Yanomami, entre os estados de Roraima e Amazonas.
O vídeo ficou no ar por cerca de sete horas e foi excluído às 16h00 desta segunda-feira (13). Indígenas isolados contam com proteção especial das leis brasileiras, pois o simples contato da população em isolamento voluntário com um vírus comum em ambientes urbanos pode dizimar o grupo inteiro em poucos dias. Em 2021, a Agência Pública revelou que um garimpo ilegal dentro da terra indígena Yanomami operava a apenas 12 km da aldeia dos isolados.
Em ofício enviado nesta segunda-feira a seis órgãos públicos (Polícia Federal, Exército, Ministério Público Federal, Funai e ministérios dos Povos Indígenas e dos Direitos Humanos), o presidente da Urihi, Júnior Hekurari, denunciou “o risco de dizimação ou genocídio do grupo isolado”. Como presidente do conselho de saúde indígena Yanomami, Hekurari foi autor de vários ofícios, ao longo do governo de Jair Bolsonaro, que chamavam a atenção para a fome na terra Yanomami. Em janeiro, o governo Lula declarou emergência sanitária e desencadeou uma operação para retirar os garimpeiros invasores da terra indígena.
“No decorrer do ano, houve a aceleração na retirada dos invasores da Terra Indígena Yanomami, ocorre que não obstante o êxito da operação em impedir a expansão das atividades de mineração, conforme demonstra a redução de alertas, a morosidade da extrusão de garimpeiros nas regiões mais isoladas do território tem sujeitado suas comunidades à violência de criminosos, inclusive, com indígenas isolados, como o grupo Moxihatëtëma”, informou a Urihi nesta segunda-feira.
Usuário tem vídeo de sobrevoo de helicóptero em região de garimpo
O usuário que postou o vídeo no TikTok, identificado como Gusta_192 foi indagado por dois usuários da rede sobre o local da filmagem. Ele respondeu que é “serra do querosene, Roraima”. É o mesmo nome dado por populares em Roraima à Serra da Estrutura, onde a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) já confirmou a presença dos isolados dentro da terra Yanomami.
Em outro vídeo, postado seis dias atrás, o mesmo usuário mostra um sobrevôo de helicóptero em uma região de garimpo. Uma fotografia divulgada em 22 de outubro apresenta um homem ao lado de um helicóptero modelo Robinson. Registros da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) indicam que o aparelho com aquele prefixo já sofreu uma apreensão em 2021 durante a “Operação Roraima”.
No vídeo, intitulado “índios canibal [sic] em Roraima #amazonia”, é possível ver indígenas circulando pelo centro da aldeia. Um homem, supostamente o piloto do helicóptero, diz: “Olha lá os canibal [sic], para quem nunca viu”. Um segundo homem afirma que os indígenas estariam atirando flechas contra o helicóptero, um gesto inequívoco da recusa dos indígenas em estabelecer qualquer contato com não indígenas.
“Olha, vai jogar as flecha [sic]. Olha as flecha voando.” Segundos depois, o outro homem pede para o piloto “vazar”, ir embora. “Vou vazar, vou vazar. Bando de viado”, xinga o piloto.
Um outro internauta pediu ao usuário no TikTok: “Respeita os cara, pow”. O usuário respondeu que “Oxe, só tava passando é bem alto”. Mas o próprio vídeo desmente o argumento, pois os indígenas são nítidos na imagem e a segunda pessoa a bordo diz que eles estão jogando flechas na direção do aparelho.
No ofício enviado aos órgãos públicos, a Urihi afirma que “o garimpo na Terra Yanomami ganha contornos ainda mais sensíveis, tendo em vista o risco de dizimação ou genocídio do grupo isolado, sendo imprescindível que as agências federais, conjuntamente com a atuação de coordenação, articulação e cooperação da União Federal, mobilize forças de comando e controle de diferentes ministérios (Ministério da Justiça, Ministério da Defesa) para apoio ao exercício de poder de polícia ambiental e socioambiental requerido”.
Em agosto, conforme a Pública divulgou na época, um grupo de entidades indígenas e indigenistas divulgou um balanço crítico sobre os seis primeiros meses da operação do governo para expulsar os invasores da terra Yanomami. Concluiu que, apesar dos “importantes avanços”, persistem focos de garimpeiros, um “sentimento de insegurança” e a falta de um “real controle territorial”. Sem o domínio completo do território, as ações de saúde continuarão prejudicadas.
Na última quinta-feira, o ministro do STF Luís Roberto Barroso determinou que o governo federal adote “todas as medidas necessárias” para que cestas básicas cheguem aos indígenas da terra Yanomami, em Roraima, que vivem desde janeiro passado a emergência sanitária ocasionada pelos quatro anos do governo de Jair Bolsonaro.
Fonte: Via apublica.org