Autores: Bianca Muniz, Caio de Freitas Paes, Rubens Valente, Alice Maciel, Laura Scofield, Matheus Santino, Thiago Domenici.
Índice do Conteúdo
Na última reportagem da série sobre as reuniões do Comitê de Crise da Covid-19, disponibilizamos a íntegra do documento
Nas últimas semanas, a Agência Pública lançou uma série de dez reportagens baseadas nas atas das reuniões do Comitê de Crise da Covid-19 (CCOP), que teve atividades entre março de 2020 e setembro de 2021. O material foi mantido em sigilo durante o governo de Jair Bolsonaro e não chegou a ser analisado pela CPI da Pandemia, de 2021.
Os documentos recebidos via lei de acesso não contam com as listas de presença das reuniões; no entanto, a maioria das atas registram quando um ministério esteve ausente ou não apresentou considerações relevantes. A análise da Pública levou em consideração essas marcações no texto para considerar quando uma pasta apresentou informes, não apresentou comentários relevantes ou não esteve presente na reunião.
Analisamos 18 dos 26 órgãos que formaram o CCOP em cada ata. Além disso, foi possível extrair dos textos a duração de cada reunião. Ao todo, foram 806 páginas, 233 reuniões (sendo três extraordinárias) com uma média de 30 minutos de duração e mais de 2 mil registros de faltas ou ausência de considerações relevantes dos ministérios ao longo dos 19 meses.
A diminuição da participação das pastas se torna visível a partir da ata da 71ª reunião, quando 14 dos 26 órgãos que deveriam estar presentes se ausentaram ou não tiveram comentários a acrescentar.
Naquele momento, o país registrava mais de 87 mil mortes por Covid-19.
A partir de então, reuniões com menos participações se tornaram frequentes. Como no período entre 16 de outubro e 28 de dezembro de 2020, que contou com 27 reuniões consecutivas com metade dos componentes do CCOP ausentes ou sem comentários relevantes.
No período em que a média de novos óbitos chegou a mais de mil por semana, entre janeiro e março de 2021, pastas como o Ministério da Educação, Desenvolvimento Regional, Meio Ambiente, o antigo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, também estiveram pouco participativos nas reuniões.
Campeões de ausências e omissões
O campeão de ausências verificadas é o Ministério da Infraestrutura. Com 117 registros de ausência, mais da metade da quantidade de reuniões do CCOP, o órgão que era comandado por Tarcísio de Freitas, agora governador de São Paulo, passou cerca de 55 reuniões consecutivas sem um representante presente. Na última dessa sequência, no dia 15 de janeiro de 2021, o país atingia a marca de mais de 200 mil óbitos por Covid-19 e 8,3 milhões de infectados.
Em seguida, o Ministério da Educação aparece com o segundo maior número de ausências. As atas registram mais de 80 reuniões sem a presença de um representante da pasta. Em 60 reuniões, o ministério não apresentou considerações relevantes, totalizando aproximadamente 140 reuniões do Comitê de Crise sem posicionamento sobre qualquer assunto. A Pública já mostrou a omissão do MEC durante as reuniões e a insistência em aplicar a prova do ENEM durante a crise sanitária de Covid-19 em Manaus.
Nas atas obtidas pela Agência Pública, é possível notar que o representante do MEC passou um intervalo de dois meses sem comparecer às reuniões ou fazer considerações. O silêncio do ministério aconteceu entre as reuniões do dia 16 de outubro de 2020 e a do dia 14 de dezembro. Ao todo foram 22 reuniões seguidas, num momento em que a Covid-19 matou mais de 11 mil pessoas.
Também se destaca o Ministério do Meio Ambiente, cuja participação foi cobrada pela Casa Civil da Presidência da República na reunião do dia 8 de abril de 2020, pois havia “várias demandas” para o Ministério comandado pelo então ministro Ricardo Salles. Foram 63 encontros sem um representante do órgão e 114 sem informações consideradas relevantes.
No período em que o Ministério do Meio Ambiente esteve ausente em reuniões, Salles aproveitava a pandemia para “passar a boiada”: medidas como uma série de alterações no Ibama que permitiram menor fiscalização para infratores e sucateamento do órgão, facilitação de exportação de madeira e maior liberação de agrotóxicos foram algumas das ações durante a pandemia.
Outro que aparece entre os ausentes é o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), com ao menos 32 ausências e 80 reuniões sem considerações relevantes sobre qualquer assunto. Durante o período das reuniões, três ministros diferentes chefiaram o MJSP: Sérgio Moro, André Mendonça e Anderson Torres.
A Pública mostrou que, ainda no período em que Moro comandava a pasta, houve um incômodo do MJSP com a resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que pedia a reavaliação de prisões provisórias e de encarcerados em grupo de risco durante a pandemia de Covid-19.
A memória das reuniões da CCOP, realizadas entre 2020 e 2021, foram obtidas com exclusividade pela Agência Pública via Lei de Acesso à Informação. Como forma de transparência e interesse público, disponibilizamos na íntegra as atas das 233 reuniões.
Metodologia
- O texto do arquivo em PDF com as 233 atas foi extraído com um código em Python, e limpo para facilitar a visualização de padrões no texto. O resultado foi colocado em uma planilha.
- A partir dos textos nas células, foram estruturadas as seguintes informações:
- Número da reunião;
- Data;
- Horário de início;
- Horário de término;
- Memória;
- Encaminhamentos.
- Na coluna “Memória”, buscamos por expressões específicas sobre a participação de uma determinada pasta, como a sigla do órgão seguido de um informe, registro de ausência .
- Os arquivos contendo as atas, dados e códigos utilizados nesta reportagem podem ser vistos no GitHub da Agência Pública.
Leia todas as reportagens da série:
Fonte: Via apublica.org