Quarta-feira, 06 de Fevereiro de 2019
Casa de Rui Barbosa digitaliza 7 mil cordéis
Uma das mais representativas manifestações culturais do nordeste brasileiro, a Literatura de Cordel deu o primeiro passo para a imortalidade. A Casa de Rui Barbosa digitalizou 7 mil obras feitas por poetas e repentistas dos mais variados rincões do país. A reportagem foi publicada pela Agência Brasil. O material estará agora disponível na internet.
Por Vinícius Lisboa
As palavras dos pioneiros do cordel impresso no Brasil e de muitos de seus sucessores farão parte de um acervo digitalizado na Fundação Casa de Rui Barbosa, instituição federal que guarda uma das mais importantes coleções do gênero literário no país.
O projeto está em fase inicial e vai abranger 7 mil das 9 mil obras da Casa de Ruy Barbosa, que ainda não estão digitalizadas. As outras 2 mil já ganharam versão digital.
O processo deve durar todo o ano de 2019, e a publicação online para o público vai depender da aprovação de cada cordelista ou de sua família. No caso das obras que já estão em domínio público, a disponibilização na internet já está garantida.
O acervo da fundação é muito procurado por pesquisadores por conter obras do início do século 20, quando o cordel ganhou suas primeiras versões impressas com autores como o paulista Leandro Gomes de Barros, chamado de "príncipe dos poetas" por Carlos Drummond de Andrade, e o paraibano Francisco Chagas Batista, que em 1905 contou a vida do cangaceiro Antonio Silvino em oito páginas que começam com a seguinte apresentação:
"Ao público vou contar
A história de minha vida
Os crimes que commetti,
Como me fiz homicida,
E porque julgo min'halma
Eternamente perdida".
O trabalho é coordenado pela diretora do Centro de Memória e Informação da Casa de Rui Barbosa, Ana Ligia Medeiros, que conta que a coleção começou a se formar quando Sebastião Nunes Batista, filho de Francisco Chagas Batista, doou seu acervo particular para a fundação. Além de servidor da Casa de Rui Barbosa, Sebastião também era poeta e organizou uma antologia da literatura de cordel.
A coleção de cordéis raros doada por Sebastião foi crescendo com outras doações de intelectuais, artistas e pesquisadores. "Se não forem organizadas por uma instituição, essas obras acabam se perdendo porque o material é delicado", pondera Ana Ligia, que acredita ser impossível ter um acervo de toda a produção brasileira de cordel, porque muitos exemplares acabam se perdendo na casa dos leitores ou dos próprios cordelistas. "A digitalização tem um papel de preservar a memória".
Com o acervo digitalizado e disponível na internet, a diretora acredita que estudiosos de todo o país poderão enriquecer suas pesquisas sobre o tema, e professores poderão usar o cordel como material paradidático com mais facilidade.
"Desde o começo, o cordel tem uma função de comunicar rapidamente e com uma visão bastante peculiar os acontecimentos atuais. É um registro de costumes", afirma ela, que acrescenta: "Ele tem uma linguagem acessível e existe uma possibilidade de utilização como material paradidático até no ensino fundamental. E assim a gente preserva a própria cultura do país".
Ana Ligia diz que temas como a natureza, o amor e atualidades de cada época e região estão registradas na história do cordel, que em linguagem popular constrói belos versos como os de "O mal e o sofrimento", de Leandro Gomes de Barros:
"Por que existem uns felizes
E outros que sofrem tanto?
Nascemos do mesmo jeito,
Moramos no mesmo canto.
Quem foi temperar o choro
E acabou salgando o pranto?"
* Sou fã da poesia de cordel. E esta, para mim, é uma obra prima. É daquelas corajosas que encurralam Deus e perguntam a ele suas razões. Escuta só!
"Se eu conversasse com Deus/ Iria lhe perguntar:/ Por que é que sofremos tanto/ Quando se chega pra cá? / Perguntaria também/ Como é que ele é feito/ Que não dorme, que não come/ E assim vive satisfeito. / Por que é que ele não fez? A gente do mesmo jeito? Por que existem uns felizes/ E outros que sofrem tanto? / Nascemos do mesmo jeito, / Vivemos no mesmo canto. / Quem foi temperar o choro/ E acabou salgando o pranto? "
Leandro Gomes de Barros é patrono da cadeira número um da ACADEMIA BRASILEIRA DE LITERATURA DE CORDEL.
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